Nos
domingos acordávamos as sete horas, ao som suave de músicas clássicas ou
orquestradas. Entretanto, naquele dia entrávamos no segundo dia de retiro
espiritual. A noite tinha havido revezamento na adoração ao Santíssimo Sacramento,
na capela do segundo andar, a que ficava no final do corredor dos quartos dos
hospedes.
Eram
horas de profunda introspecção, onde cada qual voltava o pensamento para dentro
de si, meditando na vida, no Evangelho de Jesus e nas palestras proferidas na
Sala Magna.
O primeiro palestrante do dia foi Frei
Tarcísio. Mais uma vez foi extremamente feliz em suas palavras, as quais gravei
com um gravador antigo que o Frei Anselmo me emprestou:
“Seminaristas.
É preciso crescer, crescer em todos os sentidos. É preciso ter ânsia de crescer, de
desabrochar. Faz bem em ter anseios de progredir. Para isso precisamos nos
despojar dos maus hábitos, da inércia dos caminhos instintivos. Na verdade, o
tempo e a vida vai ensinando a gente a desapegar-se de muitas coisas, para que
a carga não seja tão pesada para carregar na caminhada;
Vocês evoluem
rapidamente com os ensinamentos que o seminário lhes proporciona, mas as vezes
sentem-se desorientados o que é natural na busca do saber.
Sentir falta
de orientação é normal na vida. Ainda hoje em dia, eu também preciso, porque a
caminhada da vida as vezes tem encruzilhadas que desnorteiam. Agora, depois que
já passei por estas e aquelas situações, posso, pela experiência, orientar
outros.
Sintam nessas
oportunidades a vocês mesmos, com todo o vosso viver e lutar.
As vezes nos
encontramos mais desgostos, com queixas de que não conseguimos nos comunicar,
que o ambiente é frio, difícil de manter silêncio nas horas certas, etc. Que
idade vocês têm? Entre doze e dezesseis? Mas devo falar claro, vocês deixam,
não é?
Todos
o fitavam firmes. E continuou:
“Viu, amigos,
isto que vocês estão sentindo no ambiente e fatos que acontecem, deve estar
muito escondido em vocês mesmos. Desculpem, vocês entendem.
Em geral,
vocês devem saber também, que a vossa fase, de jovem, é uma fase de grande
abertura para a vida que há em vocês. Agora vocês vivem com toda a inocência e
boa vontade, e quando não encontram eco ou atenção ou acolhida em outros
colegas ou fatos que lhes contradizem, surge o conflito.
Esse conflito
é: puxa, caramba, eu acho a vida tão bela. Se todos me entendessem.... E
constata o contrário, quase ninguém me entende, bem que gostaria tanto…e acuso
então o ambiente, os colegas, etc.
Esse conflito,
que falei, pode ser resolvido com o tempo, isto é, buscando acolher a si,
aceitar a si, respeitar a vida que está crescendo em vocês e a vida que está
sendo plasmado nos outros. Ter um respeito ao mistério do Senhor presente nas
pessoas e na vida do ambiente e não o taxar de frio, antissocial.
Sabem, meus
queridos seminaristas, eu acho que a vida continua no mesmo. Não precisamos nos
angustiar. A nossa preocupação não vai modificar o segredo da existência e do
mistério de Deus.
Se existimos
é porque Deus quis. Portanto não fomos nós que nós fizemos. Não podemos nem
mudar a cor (natural) de um fio do nosso cabelo, nem com toda a nossa
preocupação acrescentar alguns centímetros ter a nossa estatura.
Por isso,
precisamos ter o jeito de Deus que faz chover sobre os bons e maus, que manda o
sol sobre os justos e injustos. Ele nos dá a vida e tudo gratuitamente, ou
alguém pagou o preço de sua vida?
Se é assim,
então o passado me vai dizer como Deus foi bom para com a gente. E o passado é
você hoje, no presente momento. Você é o passado que está aí presente. O futuro
é o hoje que você pode aproveitar fazendo o pouco que lhe é dado fazer.
Portanto, no presente, faça o bem o que quer que estejas fazendo, mas esteja
você, inteiro na ação que faz.
Não são as
ações os trabalhos, os feitos que nos realizam e dão paz de espírito, mas sim,
o modo como vocês praticam as ações. E o modo é o seguinte: pensar que é a
única chance que Deus lhes deu para fazer o bem. Estar todo nesta ação, sem
distração, por isso lhes são dados pelo Senhor no presente como chance para
fazer sua vontade.
Portanto,
fica aqui, uma mensagem para cada um de vocês em especial. Em tudo o que fizer
tenha sempre em vista o espiritual e nunca você se frustrará. Se você tem em
vista a você mesmo, sua promoção, então quando alguém lhe diz que não fez
direito ou que você não soube sair-se bem, você logo ficará triste, se você
teve em vista o seu bem, entende?
Mesmo que
faça mal algo (mas querendo acertar) você poderá dizer: “bem, o que eu busquei
com isto foi o bem espiritual” (que aliás não aparece, mas que deve ser um
motor de tudo).
E depois, nós
não precisamos salvar o mundo. Esta tarefa Jesus fez. O que precisamos é viver
mais intensamente a vida, e não tanto nos preocupar em fazer. Fazer também
devemos, mas que não seja o objetivo, o ideal da vida. Senão vamos fracassar
totalmente, porque uma empresa, qualquer, bem estruturada poderá fazer melhor
do que nós.
Meus caros
vossa vocação é também a minha.
É viver,
viver, viver com intensidade cada vez maior. Viver a verdadeira vida. Nunca as
tristezas vão nos preocupar e também nunca vamos nos incomodar com o que
estamos fazendo, quando o faremos, mas apenas nos preocuparemos com o modo como
estamos fazendo, porque disto dependerá o crescimento espiritual interior e o
crescimento em mais vida; Entenderam?
Essa tremenda
necessidade de colocar para fora as energias, no futebol, no estudo e mesmo em
certas bagunças, é expressão de vida, de mais vida que vocês sentem.
Então, agora
já sabem. Olhem, vai ser árduo, mas é este o caminho do crescimento.
Amigos, sigam
o caminho…Sigam em frente...Não se impressionem com “acidentes”, isto são
coisas da vida humana, provisória e passageira. Isto tudo passa. Coragem...
Quem caminha
pode experimentar cansaços, mas só quem caminha é que chega. Só há quedas para
quem caminha, isto é muito natural. Contudo precisam seguir em frente, levando
com vocês a experiência da vida. Vamos pensar nisso hoje. Cuidemos com a estrada.
Como é bom
viver assim, quando só Deus é que é TUDO, quando só Deus BASTA.