sexta-feira, 19 de setembro de 2008

FEIRA DE CIÊNCIAS - 1975 - LUZERNA - SC

FEIRA DE CIÊNCIAS


Observação: Este texto foi escrito em 1982, em Curitiba – PR, com base em anotações e rascunhos de um caderno, sobre fatos concretos ocorridos no Seminário São João Batista de Luzerna –SC, entre os anos de 1972 a 1975. Era como eu via e pensava naquela época, incluindo a linguagem. O mesmo encontra-se registrado no Registro de Títulos e Documentos – 1º Ofício, de Curitiba – PR, microfilme sob nº 541461 de 21 de novembro de 1985.


Em outubro de 1975 o seminário abre suas portas para a VI feira de ciências de Santa Catarina. Foi um acontecimento ‘suigeneris’ que movimentou a vida da vila e dos que permaneceram no seminário a fim de orientar e disciplinar o evento.

A comunidade estudantil de todo o Estado se concentrou em Luzerna - Joaçaba, apresentando trabalhos, os mais variados.

Trabalhamos muito para preparar as salas de aulas e demais espaços, onde os visitantes pudessem instalar suas experiências cientificas. Os armários foram levados para o dormitório, ficando a rouparia um local adequado para experiências químicas.

A programação ocorreu de 09 a 12 de outubro e foi a seguinte:

Comissão Central Organizadora; 9* CRE- Joaçaba. Promoção; Governo do Estado de Santa Catarina e Secretaria da Educação.
09/10- quinta-feira:

08 horas as 16 horas- recepção 16 horas sessão solene de abertura- São João Batista- Luzerna.
17 horas as 20 horas visita a feira
20 horas Jantar ás autoridades e convidados- Seminário 21 horas 30 min- apresentação SCJHO- JBA / COLIARTHE e canarinhos- Herval D,Oeste/ pequenos cantores colégio Cristo Rei- clube 10 de maio- Joaçaba.

10/10-SEXTA- FEIRA:

08 horas as 12 horas- visitação a feira
13 horas 30 min as 20 horas-visitação a feira
21 horas apresentação; peça ‘CASA DE NINGUEM (Aldo Calvet) com o grupo TEJO- Colégio Celso Ramos.11/10
SABADO:

08 Horas as 12 horas- visitação a feira
13 horas e 30 min- as 20 horas visitação á feira
15 horas-apresentação bandas de Joaçaba e Herval D,Oeste no local da feira .
22 horas- baile festivo- clube Cruzeiro 12/10 DOMINGO:

08 horas ás 12 horas- visitação á feira
10 horas- apresentação banda Colégio Aurora de Caçador
13:30 horas ás 16 horas- visitação á feira.
15:00 horas- apresentação bandas de Joaçaba, Herval D,Oeste e colégio Aurora de Caçador.
16:30 horas- sessão solene de encerramento e premiação.


Milhares de pessoas visitaram a feira de ciências. Formamos uma equipe de recepção ás pessoas e cuidamos exaustivamente, durante os quatro dias, do movimento dentro e fora do seminário a fim de resguardar o patrimônio e disciplinar horários e fluxos contrários as áreas delimitadas.

Foi uma experiência diferente. A maioria dos colegas viajaram para casa dos pais. Me senti só no meio daquele barulho incessante. Não havia superado de todo a perda do grande amigo Frei Anselmo. Tinha a impressão de vê-lo passar entre a multidão de uma sala de aula para a outra. Procurava sorrir e ser amável com todos, mas não conseguia impedir uma lágrima furtiva que teimava em escapulir de vez em quando. Parecia o fim do mundo, do nosso sereno e maravilhoso mundo. Frei Anselmo morreu, a feira invadiu nossa privacidade e o seminário se modificou, se desmistificou.....

É claro que nem todos viam sob este ângulo; muitos dançaram, comeram, beberam, ‘deitaram e rolaram’. Muitas belas garotas, visitantes, ficaram deslumbradas com a pele morena, olhos azuis, cabelos loiros dos seminaristas.

A feira de ciências foi um sucesso e, em outras circunstancias teria sido uma grande festa para nós, porém, o seminário, depois de tudo, parecia mudado. Parecia que haviam roubado nosso silêncio, nossa serenidade, nossa paz, nosso Frei Anselmo...

Na segunda-feira, durante a limpeza da casa, recolhi, jogados no chão, alguns cartões de identificação dos participantes da feira, seus nomes eram:

James D,Aquino, Rolf Prios, Marcos Rebelo e Joel A. dos ramos da Escola Técnica Tupy de Joiville –SC;

Ariomar dos Santos do colégio EBP Arnaldo Moreira Dovat de Joinville;
Justina Laudelina Da Cunha e Ivan Guse da escola Básica João Golin de Joinville;

Lírio Baruff do colégio Agrícola Senador G. de Oliveira de Araguari-SC ;

Alfredo Pedro Junior da Escola Elisa Andreoli de São José SC;

Edson R. Rosar do colégio E.T,E,T.F.E.S.C. de Florianópolis SC;

Eudes Milton Espindola da Escola M. Daysi W Salles de Florianópolis SC;

Sérgio Wendling do colégio Eurico Gaspar Dutra de Salto Veloso- SC;

Fiorindo F. Netto da Escola Básica C. Golim de Cel Passos Maia-SC

Márcia Sinzker da Escola Básica Prof Adelina Régis de Videira- SC;

Do chão recolhi ainda uma lembrancinha anônima da ‘Reprodução das Plantas Fanerógamas’, agradecendo a visita por parte de Tânia, Luiza, Sílvia, Sibelle e Andréa.

Os trabalhos de limpeza foram árduos, lavamos bem o chão, tiramos as teias de aranha do teto. Foi como se tentássemos apagar nossas pegadas, fruto das correrias dos quatro anos que chegavam ao fim.

Transferi meu armário do Jornalzinho para a rouparia. A sala do jornalzinho ficava no terceiro andar, na ala dos hóspedes. Fui seu presidente no último ano. Semanalmente editávamos novidades no mural do saguão. Todos os sábados eram expostos cartazes diferentes com mensagens que convidavam a pensar e meditar em Deus.

O ano de 1975 foi de atividades intensas. Eu era responsável pelos jardins do convento, flores das alas dos hóspedes, recepção, som, um pequeno coro das missas comunitárias, limpeza da casa, lavatório do refeitório e participava das missas de domingo, na paróquia, celebradas Frei Tarcísio. Cada aluno preenchia seu tempo com o mesmo padrão. Podia-se optar pelas atividades que fossem ao encontro dos dons pessoais de cada um. Muitos se especializaram em música, pois havia uma infinidade de instrumentos musicais a disposição de todos.

A feira de ciências me fez meditar sobre a grande possibilidade que tínhamos da paz, do recolhimento e do silêncio.

As pessoas não gostam de pensar, por isso substituem o silêncio e a tranqüilidade pelos ambientes agitados e barulhentos. O contexto ruidoso que caracteriza o mundo dificulta a vida interior. Ambientes de muita agitação despersonalizam desespiritualizam, dão uma educação viciosa, imperfeita e incompleta, têm, normalmente, caracteres vulgares onde a vontade é elástica e o capricho predomina em ambição, audácia, falta de escrúpulo e arrogância.

Naqueles quatro dias tivemos total liberdade, mas muitos não estavam preparados para enfrentar aquele contexto. O equilíbrio da procura interior pela vocação religiosa foi minado e muitos desistiram do árduo caminho da renúncia de si mesmos. Faltou sinceridade e silêncio, pois o senhor sempre concede tudo o que se procura com o coração sincero.

Não há dúvidas de que o problema humano é a busca da paz e a busca da paz se resume na busca de Deus. Quem busca a Deus precisa se aventurar na renúncia de si mesmo, porque para encontrá-lo é preciso que o coração ‘silencie’, e se pacifique e assim possa ser ouvida a voz do Criador no coração da criatura.

Muitas ‘Feiras de ciências’ surgem na vida da gente, como obstáculos a interioridade. Em qualquer lugar no ‘mundo dos homens’ existem problemas. Frei Tarcísio dizia: “O importante é tomá-lo como desafio para um crescimento maior”.